Adiantando relógios

Já prometi em uma virada de ano que iria ter controle para me atrasar menos. Melhorei bastante. Às vezes, chego até adiantado nos compromissos. Mas é um processo. Um minuto de cada vez. Concluí que me atrasava porque tenho uma relação diferente com o tempo. Eu não sinto ele passar tão veloz. Tempo tem que ser brisa, não furacão.

Sempre que vejo uma memória de rede social de sei lá quantos anos atrás, me assusto. “Nossa! Já passou esse tempo todo?”. Passou. Passa. E nada podemos fazer. Como disse o Verissimo, a outra alternativa (a morte) é muito pior. Como lidar, então?

Não sei a resposta e não saber respostas é tão bom. Um alívio danado. Sou sempre a favor de não dar tanta importância a certas coisas. Não desmerecendo tudo, mas entendendo que quase nada vale preocupação demasiada. Faço assim com a passagem do tempo. Tento não dar muita bola e ele passa numa boa, leve, mexendo meus cabelos que já têm muitos fios brancos.

Nesse acordo com os relógios, passei dos 30 anos, meu sobrinho já vai fazer dois e fiz um monte de coisa legal na vida. Nossa, meu sobrinho já vai fazer dois anos… parece que foi ontem que escrevi uma crônica, publicada aqui, para ele na semana que nasceu. “Carta ao meu sobrinho”.

Na minha ânsia de evitar atrasos, um tempo atrás, adiantei todos os meus relógios. Com isso, quando achava que não estava na hora, estava sim. Todo mundo precisa de uma ilusão. Eu esquecia que tinha feito esse ajuste nos giros da Terra e a ideia funcionava. O único problema era quando alguém me perguntava as horas. Inventei atrasos para os outros. Fiz muita gente correr. É bom para a saúde pelo menos, vai.

Na Praia da Penha, na Paraíba, vi um paulistano (o sotaque não nega) reclamando com uma tia em um bar próximo às areias dizendo que o atendimento era lento. Ela disse para ele voltar para o lugar dele, porque ali era no ritmo dela. Eu aplaudi a resposta com os dentes. O cara foi embora. A coroa venceu.

Eu até gravei um vídeo no estabelecimento dela, estava tocando alguma música que me chamou a atenção. Depois, olhando a gravação, não consegui entender a letra da música. O vento que passava, leve e barulhento, não deixou. Lembrei do outro Verissimo, o Erico, o pai. Seria o vento ou o tempo?

Meu sobrinho já vai fazer dois anos. Já passou esse tempo todo? Espero que ele não adiante os relógios. Espero que ele saiba ver o tempo passar lento, suave e às vezes barulhento, como uma brisa na Praia da Penha.