A história como deveria ser contada

A história do Brasil parece ganhar fôlego e verdade quando a cortina se abre e permite, que juntos, mudemos a história, que deveria ter sido contada com mais verdade e na íntegra. “Dar a César, o que é de César” já falava o dito popular, e no caso, dar à Leopoldina o que é de Leopoldina! Seria o justo!

Com uma interpretação prodigiosa, João Campany, o artista solo, apresenta uma obra documental, real e que vale a pena ser assistida. Com leveza, ele destrincha um texto delicioso e educativo, que todos deveriam ouvir. A educação no Brasil é precária e quando o Teatro entende essa carência e o seu papel contribui para fortalecer e revigorar a sociedade. João tem olhares expressivos e comportamentos corporais dignos de aplausos.

A mão artística de Daniel Herz parece não ter limites, pois atende com sobriedade ao texto criado por João Campany e Roberta Brisson. Uma dramaturgia contemporânea, provocativa, que levanta análises mais profundas inerentes à sociedade atual. Os movimentos de corpo trazidos para o palco foram potencializados por Daniel, o diretor dos diretores, e arrancam suspiros.

Liberdade, ou Independência? O que se busca? É embasado nesse questionamento, que o artista, e também autor, mistura ficção a registros históricos. Apenas quem estudou a vida de D. Pedro I irá entender a pesquisa aprofundada realizada pelos dramaturgos. “Liberdade é diferente de independência. D. Pedro proclamou a Independência de um país em relação a outro, que o colonizava. Mas será que, com isso, ele realmente garantiu a liberdade das várias etnias que povoavam o Brasil?”, questiona João Campany.

As questões da sociedade contemporânea também são apresentadas e refletidas no texto. O monólogo questiona valores e atitudes de um dos grandes nomes da história do Brasil. O espetáculo apresenta D. Pedro I, que parece voltar do túmulo para rever certas questões, e se apropria do corpo do artista, que duela com o príncipe regente, daí a graça e a competência desse artista diante dos olhos da plateia. Duas personagens fortes, com expressões corporais e faciais diferentes, assim como a entonação de voz. Digno e marcante!

Não é uma mega produção, mas seria digna de lotar o teatro, caso o brasileiro valorizasse e tivesse noção da importância da história recontada. As escolas deveriam ocupar o espaço da sala do Paço Imperial e levar seus alunos a prestigiarem esse espetáculo. Que maravilha poder ouvir a história de personagens importantíssimos, que viveram e perambularam por ali. Essas paredes guardam a memória da construção deste país e desta sociedade. Que todos saibam, o Paço Imperial, situado na Praça XV, residência oficial do governador e do vice-rei no século XVIII, não foi só a casa do príncipe, como também a casa de despachos da época. A reparação da história quanto à Leopoldina é tratada com dignidade, isso enriquece a história do Brasil, que merece ser desmistificada e contada com verdade.

A iluminação é da fera, Aurélio di Simoni, e a concepção do cenário e dos figurinos de Cecília Cabral. Cecília foi imensa ao trazer a coroa, numa indumentária velha e suja. Fantástico!

Um dos momentos mais interessantes da peça é quando D. Pedro leva um banho de lama quando resolve ir a Petrópolis, um hábito rotineiro da família imperial. E a pergunta: Quem governa essa cidade? Ah, se D. Pedro soubesse como está a cidade hoje em dia…

“Criada na sala de ensaio, a dramaturgia resgata e repensa a história do país ao revisitar os acontecimentos que construíram a sociedade brasileira. O texto tem influências do Teatro de Luigi Pirandello e Bertold Brecht ao buscar o conflito, a partir da relação entre os dois personagens: um artista do século XXI e um Chefe de Estado do século XIX. Idealizador do projeto, o coautor e ator João Campany vive ambos os papéis, que se alternam a partir de um minucioso trabalho de voz e de corpo. O artista também dá vida a D. Pedro I na série “Brasil Imperial”, disponível na Amazon Prime Video.” (sinopse)

Um presente nos 200 anos da Independência, um trabalho feito majestosamente, com temperos do Teatro atual. Uma obra onde a quarta parede é quebrada, o que ajuda a trazer a história de fato ao conhecimento do público. Pensar que os personagens estiveram ali naquele mesmo lugar, há centenas de anos atrás, chancela a importância do patrimônio histórico tombado pelo Estado.

Uma deliciosa e rica experiência! É fantástico poder entrar no Paço Imperial e dar de cara com a história viva, ali diante dos olhos. Viva o Teatro! Viva os fazedores de Cultura, viva as dramaturgias leais e responsáveis. Viva os artistas brasileiros, que se vestem da couraça da verdade, com coragem e justiça, usam suas vozes para ecoar o que deve ser dito e recontado! Assistam! Imperdível!

 

FICHA TÉCNICA

Texto: Daniel Herz, João Campany e Roberta Brisson

Direção: Daniel Herz

Atuação: João Campany

Cenário e figurinos: A Cecília Cabral

Iluminação: Aurélio di Simoni

Ilustrações, edição e adereços: Ágatha Kreisler

Trilha sonora original: Pedro Nêgo

Consultoria histórica: Flávia Campany

Assistente de direção: Roberta Brisson

Fotografia: Patrick Gomes

Filmagem: Thassilo Weber

Assessoria de Imprensa: Racca Comunicação (Rachel Almeida)

Produção executiva: João Campany e Eduarda Magluta

Assistência de produção: Daniel Paz

Direção de produção: Alina Lyra

Idealização: João Campany

Realização: Midiática e Alina Lyra Produz

Pedro I

Temporada até 1/10

Centro Cultural do Patrimônio Paço Imperial / IPHAN

Praça XV de Novembro, 48, Centro

Quintas e sextas-feiras, às 17h30

Sábados e domingos, às 16h

Informações (21) 2215-1784

Ingressos Gratuitos, com retirada de senha no local

Lotação 60 lugares

Duração 60 minutos

Classificação 12 anos