Beleza obscura

Muitas vezes julga-se por falta de compreensão de alguns comportamentos, julgar parece uma pena para quem julga, pouco pesa, é fácil, mas sem que se perceba, pode-se estar reprimindo voos belíssimos.

Por meio da história de Marilyn Monroe, estrela mundial do cinema e mulher-ícone do século XX, a peça convida a uma reflexão sobre solidão e depressão, temas atuais e urgentes no mundo contemporâneo, especialmente após o advento da pandemia mundial.

“’Marilyn, por trás do espelho’ investiga uma Marilyn menos conhecida, para além do glamour que a eternizou. A mulher por trás do espelho, com que muitas mulheres — e por que não homens — se identificam. Os medos, a solidão, o desejo de ser mãe, a luta pelo reconhecimento na carreira, o abandono, os relacionamentos abusivos, a baixa autoestima, temas universais que se conectam com o público. O trabalho foi concebido a partir de longa pesquisa de Anna Sant’Ana em livros, filmes e reportagens sobre a vida de Marilyn, iniciada em 2010.”  (Sinopse)

Ao entrar no teatro do Sesc Tijuca para assistir à obra, o público é surpreendido por um cenário lindíssimo, refinado, elegante, com belas cores nada fortes, claro, que é mais uma façanha da cenógrafa Natália Lana. Sempre ela! Chega um momento em que ficamos sem palavras, pois a profissional é sempre assertiva. Sempre zela pelo bom gosto e pela sutileza, sabe ser suntuosa quando necessário, sabe trabalhar bem com muito e com pouco. Natália sempre traz verdades e magias ao Teatro. O cenário conta com cortinas, tapetes, uma poltrona larga e um espelho, que apresenta um dos momentos mais belos do espetáculo, momentos em que a atriz olha para a plateia através do espelho. Tudo muito charmoso!

A iluminação de Renato Machado casa perfeitamente com o cenário de Natália Lana. Tons diferentes remetem aos momentos vividos pela atriz em cena. Efeitos leves dão vida às cenas!

Sueli Guerra trouxe movimento na a medida certa, nem mais, nem menos, nada que canse ou irrite o espectador durante os noventa minutos de espetáculo. Sueli e Natália parecem ser amuleto da sorte, basta lembrar o sucesso de “A Cor Púrpura”, a dupla é a certeza de que um espetáculo não irá passar despercebido.

As visagistas Camila Pio e Fernanda Pio, unidas à designer Carol Fanjur seduzem o público, pois só de ver a arte do espetáculo e todo o estilo trabalhado na obra, fica impossível não desejar assisti-lo! O trabalho desenvolvido pelo trio traz verdades sobre o tempo e sobre a grande estrela. Incrível!

A trilha sonora apresentada por Tibor Fittel, que outro dia mesmo estava sonorizando Pinóquio, no CCBB, arrepia, esse profissional entende do que está fazendo. Tibor Fittel é pianista, acordeonista, compositor e arranjador, além de ter excelente bom gosto musical.

“O projeto tem dez anos de idade, um trabalho desenvolvido e lapidado ao longo de uma década”, esse é o argumento de Anna Sant’Ana, atriz protagonista, para o sucesso da peça. Mas, foi pelas mãos de Daniel Dias da Silva, que essa dramaturgia perfeita nasceu. Daniel também escreveu “O cego e o louco”, interpretado pelo artista Alexandre Lino, outro belíssimo espetáculo e “Um romance inventado”, outra obra do dramaturgo, que lota o teatro PetraGold, com a belíssima atriz Sylvia Bandeira. O texto sustenta o espetáculo, juntamente a atuação da incrível atriz. Não dá para piscar, apenas para ficar com os olhos admirados e grudados na “Marilyn”.

Triste mesmo é saber das tantas mazelas que cercaram a vida dessa uma mulher obstinada ao sucesso, mas que viveu presa ao seu passado tão sofrido, cheio de disfunções, que terminaram por leva-la ao precipício. Do inferno ao paraíso, e do paraíso ao inferno, assim foi a vida de Marilyn Moroe.

O texto segue o cronograma perfeitamente, não se atropela. Tudo bem contado, da infância à mulher linda que o mundo admirava. De Norma Jeane à linda e poderosa Monroe!

Saber da maldade de Frank Sinatra é bastante ruim, um mito que cai no conceito de qualquer pessoa, que após conhecer a sórdida história, perde o encanto até por “New York, New York” e “My Way”. Sinatra sabia que Marilyn tinha seus problemas psicossomáticos e não levou isso em consideração quando arquitetou e encobriu o abuso coletivo sofrido pela atriz! Uma vergonha mundial, ele foi sórdido e cruel! Claro, sendo ela “uma mulher vulgar” — como diziam e ainda dizem os machistas de plantão — e na tentativa de diminui-la e até de anuviar seus sucessos, em dezenas de filmes e prêmios, e o valor de duzentos milhões de dólares arrecadados em seus filmes.

A violência ocorreu no dia 28 de julho de 1962. Sua morte, por conta de uma overdose de remédios, ocorreu no dia 4 de agosto de 1962, mas é claro, que ser abusada por vários homens poderosos não a levaria ao suicídio, principalmente quando a vítima na infância já havia sido abusada. Marilyn inclusive foi uma das primeiras celebridades a falar abertamente sobre o assunto na mídia. Marilyn foi uma guerreira, acreditem!

Joana Seibel assina o figurino, que muda inúmeras vezes, trocados enquanto a história é narrada, deixando o público curioso para saber qual será a próxima indumentária da diva. Vermelho, branco, brilhos e plumas.

A direção é da portuguesa Ana Isabel Augusto, que também dirigiu a leitura dramatizada em Portugal, em fevereiro desse ano. Ana conta que trabalhar nesse texto sendo uma mulher tem um grande diferencial, é possível sentir a dor e a falta de cordialidade, sofrida pela linda Monroe.

Anna Sant ‘Anna, atriz que dá vida ao texto, deixa suas lágrimas comoverem a alma de quem assiste, numa explícita sororidade entre ela e a atriz que interpreta. Há compaixão em Anna enquanto o texto sai de sua boca, parece que sua alma é que fala. Anna sente verdadeiramente aquela tragédia, tem sensibilidade em apresentar a menina Monroe e também a esplêndida mulher da qual até hoje se fala. Anna dança, canta, encanta, empresta o coração e se solidariza com o passado de Marilyn. Maquiada e com uma peruca loiríssima, ela chega ao palco despida da covardia e encara um dos papéis mais belos que uma mulher pode ter, que é defender a memória de uma outra mulher, subjugada e julgada covardemente.

Não deixe para depois, pois ter a oportunidade de assistir a uma peça como essa é raro!

 

MARILYN, POR TRÁS DO ESPELHO

Temporada até 28/8

Sesc Tijuca – Teatro II

Rua Barão de Mesquita, 539, Tijuca

Quintas, sextas, sábados, às 19h e domingos, às 18h

Ingressos R$30, R$15 (meia) e R$7,50 (credencial plena)

Ingresso grátis (PCG)

Funcionamento bilheteria de 3ª a domingo das 9h às 19h

Classificação 16 anos

Duração 80 min

Capacidade 44 lugares

FICHA TÉCNICA

Idealização, Atuação e Argumento: Anna Sant’Ana

Dramaturgia: Daniel Dias da Silva

Direção: Ana Isabel Augusto

Supervisão de Direção: Roberto Bomtempo

Assistente de Direção: Letícia Reis

Iluminação: Renato Machado

Trilha Sonora: Tibor Fittel

Figurinos e Caracterização: Joana Seibel

Cenário: Natália Lana

Direção de Movimento: Sueli Guerra

Preparação Vocal: Rose Gonçalves

Design Gráfico: Carol Fanjul

Social Mídia: Gabriela Ridolfi

Fotos: Andrea Rocha/ZBR

Filmagem e Edição de Videos: Alyrio Tkaczenko

Visagismo: Camila Pio e Fernanda Pio

Costureira: Nice Tramontin

Cenotécnico: André Salles e Equipe Fisioterapeuta: Alessandro Costa

Preparação Física: Gustavo Bassan

Operação de Som: Bruno Jahú

Operação de Luz: Kadu More e Augusto Faustino

Contra-regra/Camarim: James Simão

Produção Executiva: Maira Cibele e Bruno Jahú

Direção de Produção: Anna Sant’Ana

Realização: Sesc Rio, Movimento Carioca e Sant’Ana Produções & Artes

Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação João Pontes e Stella Stephany