Próximo ao dia das Mães, mais uma tragédia para levar os filhos de Maria aconteceu na favela do Jacarezinho. O Estado realizou uma operação no bairro, que até o momento contabilizava 25 mortos. Uma das maiores cachinas em operação policial já vistas, a segunda maior da história do Rio de Janeiro. A mídia baba em rede nacional que todos eram “suspeitos”, fico me perguntando, suspeitos de que?
O Estado civilizou os modos de matar pretos e pobres introduzindo a noção de risco e de inimigos, criando uma ideia absurda de que há uma guerra legítima, de um bem contra um mal, espalhada, indiscriminadamente, pelos territórios favelados, que precisa ser pacificada, com mais guerra. A execução em série virou um instrumento impessoal e puramente técnico, destinado a controlar determinados corpos desprezíveis. A ideia de paz é de uma guerra sem fim, e o empilhamento de cadáveres.
As “favelocolônias” são habitadas por selvagens, apartados do mundo humano, que oram a deuses animais, e são uma entidade distinta, passíveis de aniquilação. São inimigos do Estado, são zonas de desordem em que habitam seres externos às políticas, que precisam ser controlados para garantia da ordem judicial, onde a violação do Estado é justificada a serviço da “civilização”. Que civilidade é essa? De que serve a lei, se vivemos constantemente em caráter de exceção?
Morreram porque eram “suspeitos” de serem pobres, pretos, transgressores das regras de um Estado assassino, que mata ou deixa morrer, por ausência de políticas públicas, de proteção, de alimento, de educação, de saúde. Suspeitos de sujar as ruas com seus corpos pretos e imorais, com sua sujeira e asquerosidades, com sua sexualidade, com seu lixo, sua podridão, falta de iluminação e inteligência, sua inutilidade, seu perigo, sua selvageria. O medo da cor de suas peles é o medo de que se comportem como integrantes da natureza, há tempos negada pela civilidade em nome de uma razão irracional.
Quem vai chorar seus corpos? Quem paga seus lutos? Quais são seus nomes? Tinham filhos? Quem pagava as contas? Um domingo triste para algumas mães, esposas, crianças, que, além da tragédia proporcionada pelo vírus, que tem levado muitos filhos, e pela tragédia do governo que tem um projeto político de morte e acaba de levar mais uns, pelo simples direito de matar.