Cabelos brancos estão longe de serem falta de vaidade ou de cuidado. Senhores, cabelos brancos legitimam as experiências vividas, o quanto se sabe e o orgulho de ser quem realmente somos. Cabelos brancos, cada fio deles, pode deixar em evidência o quanto de aprendizado se teve na jornada…
Os cariocas estão de frente a oportunidade de assistirem ao espetáculo “Ficções”, que provocará profundas análises. O espetáculo inspirado no livro “Sapiens – Uma breve história da Humanidade” de Yuval Noah Harari. Esse best-seller é recomendado por uma lista intensa de leitores reconhecidos no Brasil e também fora dele. Entre eles Barak Obama, Bill Gates, Leandro Karnal, Djamila Ribeiro e outros mais de 23 milhões de leitores.
Segundo Felipe Heráclito Lima, ator formado pela CAL, publicitário e idealizador do projeto — é um livro que permite uma centena de reflexões a partir do momento em que nos pensamos como espécie e que, obviamente, dialoga com todo mundo. Acho que esse é o principal mérito da obra — analisa.
Felipe H. Lima comprou os direitos para adaptar o livro para o Teatro, em 2019. Felipe não é só bonito por fora, fica claro como essas questões humanas tomaram seus pensamentos, em poucas e resumidas palavras ele afirma se encontrar um pouco em cada religião, é possível enxergarmos sua imensa beleza interior, sua dimensão e o respeito que o constrói. Felipe, durante a pandemia, trouxe o espetáculo infantil “Baile Partimcundum”, que também passou merecidamente por essa coluna. O ator não se limita a excelentes idealizações, ele sabe escolher bem a sua ficha técnica. Nomes gigantes estão sempre presentes e a seu lado, Karen Brustolin, Adriana Falcão, Bia Junqueira e agora, lançou seu olhar de águia aos profissionais de ouro do Teatro brasileiro. Emerge com o musicista Federico Puppi, Wesley Cardozo, Rodrigo Portella, Miwa Yanagizawa e para legitimar tudo que foi dito, traz nada mais, nada menos, que Vera Holtz. Vera Holtz por inteiro.
Rodrigo Portella trabalhou o texto com a graça de sempre. Um texto gostoso, simpático e belo! Um trabalho totalmente desafiador, mas Portella como sempre se supera. Ele sabe o que fazer e faz. “Eu queria fazer uma peça que fosse espatifada, não é aquela montagem que é uma história, que pega na mão do espectador e o leva no caminho da fábula. Quis ir por um caminho onde o espectador é convidado, provocado a construir essa peça com a gente. É uma espécie de Jam session. É uma performance em construção, Vera e Federico brincam com tudo, com os cenários, tem uma coisa meio ‘in progress’”, afirmou.
Quebrar a quarta parede foi inteligente, sensacional!
Aqui na coluna Plateia, Federico Puppi é sempre reverenciado, já não existem mais palavras para falar sobre esse incrível artista. Federico ao lado da atriz, brinca com seus instrumentos. Federico, responsável pela trilha sonora, está em um momento especial, faz absolutamente tudo com excelência, com entrega, o artista declaradamente é casado com sua arte. Simples assim.
O cenário de Bia Junqueira é simples e instigante, bem de acordo com o texto. “Estima-se que os primeiros Homo sapiens tenham aparecido entre aproximadamente 300 mil e 100 mil anos atrás”
E no palco uma rocha imensa representa a Era Neanderthal, ou poderia ser um cérebro. Os objetos de cena são bem-vindos. Um berrante no lugar de um celular, tudo tão desconexo, e, simultaneamente, conexo! Afinal, quase tudo é ficção.
O figurinista trouxe indumentárias sem cores quentes, João Pimenta foi ao encontro da sofisticação. Ainda mais ao expor o corpo da atriz, ele foi elegante, sedutor e assertivo.
Paulo Medeiros executa a iluminação da peça, que além de linda, evidencia absolutamente tudo que precisa ser visto.
E vamos finalizar com a atriz Vera Holtz! A atriz está belíssima, estupenda! Dizem por aí que Vera está quase com setenta, deve ser mentira! Vera esbanja beleza, juventude, brilho no olhar, ela está cheia de força, dinâmica. A obra “Ficções” não podia ter outra profissional. O texto sai da boca da atriz como um discurso próprio, ela se apossou dele. Ela passa uma sensação de total liberdade performática, de que está com as rédeas nas mãos, como se o texto tivesse sido concebido por ela, ela está inteira ali, plena. Vera sabe que pode e deve ser ela, e é isso que a faz brilhar.
Em um certo momento, a atriz interpreta o público e se coloca no lugar de alguns da plateia, usa tons de vozes diferentes e “promove” um diálogo entre eles. Ela está incrivelmente perfeita!
Em suas redes socias, Vera também faz performances e ocupa seu espaço como artista. Ela parece ter se fundido ao seu ofício, como se não existe uma Vera diferente dos seus personagens. Vera é todos eles. E assim também é no palco.
Vera quando não está sob os holofotes, está como espectadora, ela é do Teatro. Atua de dentro para fora, com simpatia, firmeza e expressões faciais e corporais lindíssimas, sem contar que mesmo em um figurino menos sufocado de tecidos, em lingeries mais comportadas, tem a sedução na dose certa. Vera é gigante!
“O livro divide o progresso da humanidade em três grandes revoluções: a cognitiva, a agrícola e a científica. Na primeira Revolução, o autor explica como a capacidade de abstração e memória que somente o nosso cérebro possui, nos permitiu formar sociedades nunca vistas”.
Uma parte do texto chama muito a atenção e merece ser mencionada. Quando a atriz se posiciona como mulher e expõem sua vontade quanto a maternidade, a ternura parece tomar conta do teatro. É quando o olhar humano se esparrama e o belo vem de encontro e toca cada um ali presente. Ao se pronunciar, fica a imaginar seu filho como um ser humano que pode salvar um animal, um ser feliz… que talvez possa ajudar a transformar o mundo.
Um texto revigorante, que centelha fios de pensamentos, onde até Deus pode estar presente… Deus, ou a deusa Vera…
VERA HOLTZ EM FICÇÕES
Temporada até 30/10
Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) – Teatro I
De quarta a sábado, às 19h30, domingo, às 18h
Ingressos R$ 30 e R$15 (meia)
Classificação 12 anos
Duração 80min
Clientes Banco do Brasil têm direito à meia-entrada na compra com Cartão Ourocard.
FICHA TÉCNICA
Inspirada a partir do livro Sapiens – Uma breve história da humanidade, de Yuval Noah Harari
Escrita e encenada por Rodrigo Portella
Idealizada por Felipe Heráclito Lima
Performance e Trilha Sonora Original: Federico Puppi
Interlocução dramatúrgica: Bianca Ramoneda, Milla Fernandez e Miwa Yanagizawa
Assistente de direção: Cláudia Barbot
Cenário: Bia Junqueira
Figurino: João Pimenta
Iluminação: Paulo Medeiros
Preparação corporal: Tony Rodrigues
Preparação vocal: Jorge Maya
Programação Visual: Cadão
Fotos: Ale Catan
Direção de produção: Alessandra Reis
Gestão de projetos e leis de incentivo: Natália Simonete
Produção executiva: Wesley Cardozo
Administração: Cristina Leite
Produtores associados: Alessandra Reis, Felipe Heráclito Lima e Natália Simonete