Trilha sonora da vida

A música nos acompanha e está presente em todos os momentos de nossa vida, como um anjo da guarda. Do acalanto, quando bebês, ao “parabéns pra você” e ao temido “com quem será” ou pela trilha sonora do nosso dia a dia, seja em casa, indo ou voltando do trabalho, nos estudos, no lazer, nas festas, eventos…

Alguns momentos ficam tão relacionados a músicas, que é difícil não lembrar de tais situações quando voltamos a ouvi-la. É como uma cápsula do tempo, que, como mágica, nos remete às férias, comemorações, namoros, romances, histórias marcantes da política e dos esportes, sejam de alegria ou tristeza.

Com o tempo, surge um vínculo aparentemente tão natural, que é comum, em algumas datas, se tocar tal canção de propósito, para funcionar como uma “pílula” ativadora de lembranças e sensações de outrora, fazendo todo um grupo, se emocionar, por exemplo, numa comemoração de formatura.

Quando tem essa função, são separadas e rotuladas em tantos tipos que quase deixam de ser arte: música para tocar, cantar, escutar, dançar, malhar, torcer, protestar, meditar… Até mesmo para reprogramar o cérebro, como mantras ou jingles. E não nos damos conta do quanto ela é presente em nossa vida.

Às vezes, até mesmo na morte… alguns velórios são rodas de música, que comemoram a vida que foi vivida por quem se foi, exaltam seus feitos, rindo de seus defeitos, perdoando seus maus feitos mas, nunca, chorando pelo fim. Afinal, sempre esperamos que a tristeza seja, apenas, a saudade de quem fica.

Lembro que em março de 2019, o “Bip Bip”, um conhecido botequim, núcleo de resistência cultural e de boa música, em Copacabana, foi o endereço do velório de seu dono, o Alfredinho, onde muitos amigos e músicos estiveram tocando, para homenageá-lo. Não poderia ser diferente e, além de tudo, era sábado de carnaval.

Impregnada em nossa cultura, a música pode soar “natural” em qualquer habitat criado pelo homem, como igrejas, mercados, rodoviárias e aeroportos. Qualquer que seja nosso humor, da tristeza à euforia. Como parte integrante de outras artes, como o cinema e a dança, paralelamente, permeia nosso cotidiano, em elevadores, carros, restaurantes, lojas, eventos, comícios. Presente e despercebida…

Até mesmo, na língua. Usamos, corriqueiramente, expressões que fazem analogia a música e que podem traduzir de forma mais direta, como uma gíria, situações difíceis de explicar sem uma comparação, metáfora ou prosopopeia. Este uso, vai além dos termos técnicos, mencionados num outro texto.

Quando queremos dizer que alguém está repetitivo, usamos a palavra “monótono”, que quer dizer que se está num mesmo tom ou mesma nota, ou seja, voltando ao mesmo assunto. Mas também usamos a expressão “batendo na mesma tecla” que é muito bem compreendida e nem notamos o uso.

A expressão “É música para os meus ouvidos” é mais explícita, já que usa a palavra “música” e sugere que alguma notícia foi muito bem-vinda. “Fazer a toque de caixa”, quer dizer fazer com rapidez. Eu diria que, para respeitar o toque da caixa, ainda é preciso atenção e regularidade.

Quando se diz que algo “soa familiar”, não necessariamente, se fala de música, mas de som. E de nossa capacidade de reconhecer timbres. Desde a voz de parentes ao telefone, sem precisar do identificador de chamadas, até o som do carro ou das chaves de nossos pais, quando ainda estão fora de casa.

“Ditar o ritmo” nada mais é do que dar as ordens. Na orquestra, quem faz a contagem para o “ataque” de entrada das músicas é o maestro. No trabalho, quem manda é o chefe. Em casa, a esposa. E, por aí, vai…

Falando em intimidade com o ritmo, temos o “Pé de valsa”, que é aquela pessoa que dança muito bem e, por isso, é requisitado para dançar com todos os presentes, dividindo com os humanos “normais”, um pouco de seu “dom”. Muitas vezes, uma pessoa pode “dançar” de outras maneiras.

O “vai da valsa”, é o acomodado, aquele que não tem perspectiva, que vai para onde o mar leva. Um pouco diferente de quem faz isso de forma premeditada e, na vida pública, “entra na dança” conscientemente.

Da mesma forma que podemos usar a expressão “dançar conforme a música”, para um político que se tornou produto de um meio sem ética, em que frequenta e convive, também podemos usa-la para um jovem que deve se adaptar ao seu novo turno da faculdade, se adequando e estando de acordo com as regras.

Quando estamos indignados, devemos reclamar e “botar a boca no trombone”. Afinal, está mais do que na hora de inverter o ditado: “os incomodados que se mudem” e incomodar. “Soar o gongo” para tirar de cena quem tanto nos oprime com promessas não cumpridas. Chega de “bater palma pra maluco dançar”.

Ou fazemos barulho ou vamos continuar a “dormir com um barulho desses”. Se “o show tem que continuar”, é preciso pensar global e agir local. Como disse o mestre Sivuca: Let’s vamos?

Até a próxima!
Paz!