Lembram do funk “Deu Onda“? “A sua presença me deu onda…”. Na ausência da quarentena, sair na rua me deu onda. Botar o pé fora de casa se tornou uma experiência lisérgica.
Atravessando as pistas aqui perto da minha casa, parece que estou entorpecido por alguma substância qualquer, que causa uma sensação de ampliação da realidade que me cerca. Os carros ficam maiores, as pessoas se multiplicam. O som da cidade é ensurdecedor.
E não sou só eu quem está chapando nessa. Pelo visto, o produto é daqueles que se compartilha em grupos. “Passa a bola, Romário”. Muitos amigos me contaram que viveram essa onda diferente ao sair de seus lares para as necessidades essências.
Mesmo quem está saindo todos os dias para trabalhar, desde o início da quarentena, relata que paira alguma coisa estranha nos dias.
Até minha mãe, careta profissional, disse que se sente “flutuando” quando sai à rua após dias e dias de confinamento. “Só as mães são felizes”, cantava Cazuza, o rapaz estudioso do dinheiro, carreira e canudo.
Como quase toda onda, essa muda a cada vez. Nenhum vinho é igual ao outro. Aliás, depois da onda de sair na rua, a que tenho mais sentido é a de um bom tinto. Só assim para as coisas ficarem mais suaves em dias tão secos de esperança.
Falando nisso, às vezes bate a bad trip existencialista. E a questão que ecoa no juízo é: quanto tempo dura essa onda? E pior: será que ela passa um dia?