Biologicamente falando, quando se nasce sob o gênero masculino, as indecências vão se incorporando à rotina de forma tão naturalizada, que passam a ser encaradas de maneira natural, exploratória e confessa. Natural porque os meninos são mais do que incentivados a compreendê-las, uma vez que muitas vezes os adultos nem sequer se preocupam ao expressarem-se na frente das crianças deste gênero. Exploratória, porque aparentemente é mais recorrente essa descoberta, a busca pela iniciação e descoberta da sexualidade pelos meninos e confessa porque os homens podem falar livremente, ainda que inicialmente entre si, sem serem julgados. Mas quando se nasce sob o gênero feminino essa realidade muda e muito de figura. Primeiro, que não é atribuída às indecências um grau de, digamos naturalidade. Segundo, porque as meninas são tão cerceadas em sua educação, que até mesmo se tocarem não é uma atitude fácil ou recorrente e confessa muito menos, já que por conta das convenções, dos tabus e dos preconceitos e rótulos, as mulheres acabam por julgarem e condenarem-se entre si mesmas, o que inibe muitas vezes o compartilhar de experiências.
As mulheres foram durante séculos incentivadas a não ouvir, não praticar, ter compostura, e comportarem-se até mesmo com certo repúdio acerca dessa temática. Tiveram quase que sequestrada a descoberta do próprio corpo, o desenvolvimento de sua sexualidade, o seu lado erótico, e o livre exercício de sua vida sexual. Ancorada no discurso reprodutor, a sociedade fez questão de negar a mulher significativa parte dos prazeres carnais, que o sexo proporciona. E na busca de poder exercer sua vida sexual, a mulher vem galgando novos patamares ao longo dos tempos. Mais do que tabus e convenções morais, que envolvam essa temática, ela anseia para que haja cada vez mais a vivência da verdade. Da verdade de cada um. Para tanto, é preciso reconhecer que as ditas “indecências” são presentes e necessárias em ambos os universos: masculino e feminino.
Imprescindível reconhecer que elas correspondem a momentos excitantes e leves que servem como atenuantes das realidades corridas, duras e difíceis com as quais se vive. Falar sobre as experiências, se permitir conhecer o universo erótico, é fundamental para a expansão deste tema no universo feminino. A pornografia e as imagens eróticas são excitantes se as mulheres deixarem para trás as convenções, o que lhes foi ensinado, e passarem a ousar conhecer tudo que envolve o erotismo. Quando uma análise real é feita, pode-se aferir que muita coisa precisa ser falada, muitas coisas deveriam ser explicitadas, e tudo para melhorar os relacionamentos sexo afetivos.
Chega de conformismos que fazem com que principalmente as mulheres relevem o subaproveitamento de seu prazer em detrimento a outras qualidades que seu parceiro ou parceira tenham. Chega de “puladas de cercas” não pactuadas em nome de alcançar algo que a relação monogâmica não está oferecendo. Será preciso que algumas de nós tenham coragem e dispam-se da vergonha, do medo do julgamento, da falta de aceitação e tragam à luz várias reflexões e indecências que permeiam nossas mentes e corpos. Somente assim, quando houver disposição para o diálogo (des) preconceituoso os casais irão afinar sua sintonia, considerando e extraindo o maior prazer possível de suas relações. E neste processo, todos sairão ganhando, sobretudo porque nos fará compreender, que mais importante do que julgamentos morais pautados em convenções machistas e desiguais, será a valoração da lealdade, que deve sempre começar em relação a si mesmo, quando somos leais ao que nos dispomos a viver. Se é um relacionamento monogâmico, poligâmico, casual, liberal, entre quaisquer que sejam as orientações e as identificações de gênero, sejamos todos livres para respeitar nossas escolhas integralmente.