Irene Ravache se fez necessária, aliás se faz, sempre, principalmente quando apresenta um espetáculo lindo como “Alma Despejada”.
Fácil julgar, fácil até dizer “desapega”… mas nada é tão fácil como parece. Há como desapegar das próprias histórias? Há receita?
“Em sua visita derradeira, Teresa lembra de histórias e pessoas importantes em sua vida como a funcionária Neide, que trabalhou em sua casa por 30 anos, e sua melhor amiga Dora. A personagem transita entre o passado e o presente, do outro lado da vida, sempre de maneira poética e bem-humorada.”
E mais uma vez o Teatro se achega com encanto e com magia, como o Teatro deve ser.
Irene Ravache, como um ser sagrado ou feérico, se aproxima com uma graça impossível de ser dimensionada em palavras. Provavelmente Machado, o Assis, pudesse fazê-lo, como merecia a atriz.
Não se sabe se Irene é essa mulher dócil, ou se a sua personagem é feita de algodão-doce,
a obra é um pote de açúcar em sua totalidade, mesmo com as decepções, que fazem parte da caminhada, ninguém sai ileso, mas até diante do atraso humano, a história é contada com lealdade e isso basta. É real para cada um dos espectadores.
A voz da atriz é delicada e transporta a todos para dentro desse ambiente. O cenário é constituído no imaginário de cada espectador, é possível sonhá-lo assistindo a Irene.
O passado atravessa o espetáculo, mesmo no virtual. A senhora Irene Ravache brilha ao contar as experiências de sua personagem, dentro e fora deste plano espiritual. Vale ressuscitar o ditado popular: “da vida, nada se leva”.
É uma enxurrada de verdades, da realidade sobre a vida. A dicção é pausada e indagadora. O audiovisual, que esteve no Sesc ao vivo, volta com toda sua beleza, para ajudar os profissionais do Teatro, que estão em situação complicada devido à pandemia. Retorna, por intermédio da primeira Mostra de Teatro on-line APTI, com a missão de fortalecer a Fundação Marlene Colé, que promove campanhas em prol do meio artístico desde o início da pandemia. E esse espaço não passará desapercebido, pois é dando as mãos, que se fortalece em tempos difíceis.
Um espetáculo que fala de forma clara e direta à plateia virtual, que se delicia com a diva.
Irene se apresenta sem figurinos estonteantes, sem o cenário, que os amantes de
Teatro adoram, mas com uma excelente qualidade de áudio e filmagem. A tríade cênica perfeita! Ator, dramaturgia e público, como o teatro deve ser.
A maravilhosa atriz questiona, reflete, brinca e fala muitas verdades. “A caveira nos iguala, sempre sorridentes e parecidas”, uma das percepções sensíveis e reais da peça. Irene, em “Alma despejada”, diverte e alerta. Até quando essa falta de espiritualidade irá rondar a humanidade?
O Teatro, com legitimidade, aplica as provocações necessárias. Trazer à tona a dinâmica vida e morte, justamente neste momento doloroso de perdas e despedidas, pode parecer complexo, mas instiga que sejam superados os apegos às pequenices, que aprisionam os seres humanos aos seus mundos particulares.
A personagem dá uma aula, ainda que ficcional, ainda que possa parecer absurda, mas tudo tem imenso valor.
Não há um mito, um Teatro épico, nada heroico, mas vibra-se. Reafirma-se que o mais importante mesmo é viver o momento, viver o presente, o hoje.
E o teatro cumpre mais uma vez, um papel fundamental de fazer repensar, olhar mais atento aos detalhes, que podem passar desapercebidos, que muitos julgam serem clichês.
Mas longe de ser clichê, a atriz brilha em todos os detalhes, mesmo diante de um discurso piegas, mas necessário. Com um texto provocativo, o espetáculo consegue atrair as atenções.
A dramaturgia é linda, viva e, principalmente, técnica. Drama, com nuance de graça e intelectualidade. Abrange a todos os itens que compõe um espetáculo redondo. E com a atuação da gigante atriz, tem-se uma obra primorosa!
Diante dela, cria-se a própria dramaturgia, construindo em paralelo o universo cênico, bem vívido em cada mente! Despertam-se as histórias adormecidas e tudo vem à tona e à mente.
Irene fala dela, de sua personagem, em pretéritos perfeitos e imperfeitos e todos fazem também a mesma conjugação. É lindo, um experimento imperdível.
A história permeia o universo político, haja chumbo! Trata-se de poesia e para entender os versos de um poema, precisa-se também de ser um pouco poeta! E é possível construí-los, porque não falta a ninguém boas rimas, quando os sentimentos adentram a alma! E na mais plena construção dos vocábulos muitas histórias podem ser narradas, enquanto o audiovisual acontece.
“Alma despejada” é uma bússola, de como deve-se viver…
Mãos arteiras, construíram um espetáculo rico e eficaz aos que têm ouvidos!
Foto Jonatas Marques
ALMA DESPEJADA
1ª Mostra de Teatro On-Line APTI
Dia 1/8, domingo, às 18h
Classificação: 14 anos
Duração: 80 minutos
Gênero: Comédia dramática
Ingressos: R$25, R$50 e R$100 (o cliente escolhe)
Vendas: Plataforma Sympla
Transmissão: Sympla Streaming
Informações: www.apti.org.br
Instagram: @apti_sp
FICHA TÉCNICA
Texto: Andréa Bassitt
Direção: Elias Andreato
Atuação: Irene Ravache
Cenário e figurino: Fabio Namatame
Iluminação: Hiram Ravache
Música: Daniel Grajew e George Freire
Fotos: João Caldas Filho
Assessoria de imprensa: Adriana Balsanelli
Produção: Oasis Empreendimentos Artísticos Ltda