Esmiuçar a vida alheia pode ser surpreendente

A peça Jacy, do coletivo Carmim, tem mais de dez anos em cartaz e continua a rodar pelo Brasil, com graça, beleza e maturidade. Para entender porque o espetáculo Jacy continua de pé, basta assistir à obra.

O artista encontrou uma maleta na rua e começou a estudar a proprietária do objeto, assim começou essa dramaturgia, uma montagem diferente, que deu certo!

O espetáculo conta com diversos desdobramentos da vida de Jacy, tudo contado com encantamento e humor.

A obra, que traz um texto redondo e agradável, poético e contemporâneo, não conta com uma superprodução, nem com efeitos especiais de iluminação e de palco, embora seja carregada de tecnologia. O texto instiga, prende a atenção aos artistas e suas interpretações, o elenco está potente, todos talentosíssimos. Jacy esteve no Sesc ao Vivo, durante a pandemia, lógico que o espetáculo chamou a atenção, mas poder assisti-lo ganhando vida no palco é uma delícia.

A perspicácia do grupo ao desenhar a vida de uma pessoa, normal como qualquer outra, mas com uma história única de vida, e toda poética usada ao desnudar Jacy, sem contar o amor, tornam este espetáculo peculiar, único. Porque há um olhar preciso sobre essa personagem da vida real, e na medida que se vai desvendando sua trajetória de vida, há uma invasão de sentimentos.

A atriz Quitéria Kelly trabalha com leveza, brinca de ser Jacy, como uma pluma, delicadamente faz um trabalho muitíssimo afetuoso. Henrique Fontes além de ter criado o texto, dirige e atua. E que atuação…

Em um certo momento Quitéria e Henrique deixam o público em cólicas de tanto rir, eles transportam a plateia a vários sentimentos, artistas natos, nasceram para os palcos. São artistas de ouro! É possível imaginar o orgulho que o estado do Rio Grande do Norte tem por esse coletivo, tão cheio de profissionais habilidosos.

E mesmo diante dessa façanha, de apenas falar sobre uma mulher, eles mostram competência cênica, conhecimento teatral e das teorias mais nobres, que a arte carrega em sua história. Ao lado, com uma câmera, Robson Medeiros leva ao espetáculo alguns vídeos.

Falar de Jacy não é difícil, trata-se de um espetáculo de 60 minutos, que se encarrega do começo ao fim, de relatar uma história, que poderia ser como qualquer outra, a diferença é a licença poética trazida ao palco, na verdade, a muitos palcos, pois o espetáculo não para de circular e sempre que se apresenta no Estado de onde veio, esgotam-se as entradas. Por quê? Porque a linguagem é simples, coloquial, informal e todos compreenderem Jacy.

A personagem tem um figurino simples, aliás tudo é muito simples. Arrebatador é mesmo o texto, arrebatadoras são as atuações, impecáveis! O estado do Rio Grande do Norte parece não ter limites, ou fazer do céu o limite. São também de lá, A Casa de Zoe, as meninas do belíssimo espetáculo Candeias e o Carmim. Incrível como trazem a Cultura Nordestina nas entrelinhas dos espetáculos, no caso de Jacy — “a terra onde temos maior cajueiro do mundo” (texto).

É apaixonante a força desses talentosos artistas, os potiguares são imensos quando se fala em Teatro, nas Artes Cênicas nada deixam a desejar. A Casa de Zoe apresenta um espetáculo mais produzido, como, por exemplo, o lindíssimo trabalho “Meu Seridó”.  Já o Carmim tem nobreza no texto, esteve nas telas durante a pandemia, com um dos melhores espetáculos teatrais do Brasil: “A Invenção do Nordeste”. O espetáculo on-line com o maior público na internet. É o Nordeste, é o Brasil descendo a ladeira, sem medo, com firmeza.

Artistas politizados e destemidos, não temem vaias, manifestam abertamente suas ideias no palco. São plenos, o Carmim tem beleza, potência e não tem freios ao apresentar projetos incandescentes. Sem medo de se queimar, se constroem e se desconstroem inúmeras vezes, tantas quantas for necessário para lapidar a obra, tal qual um diamante.

Jacy carrega nobreza, embora seja um espetáculo simples, também carrega humor, com um texto denso carrega tudo que é necessário na construção de um espetáculo que faz sucesso desde 2013!

“Em pesquisa para um espetáculo teatral, o diretor, ator e dramaturgo Henrique Fontes encontrou uma frasqueira jogada no lixo contendo vestígios da vida de uma mulher de 90 anos, na esquina de uma das principais avenidas de Natal, no Rio Grande do Norte. Esse fato levou o grupo Carmim a conduzir uma investigação que durou 3 anos e que, em 2013, resultou na peça de teatro documental intitulada “Jacy”. Em 1 hora o grupo revela todo o processo de investigação e convida a plateia a acompanhar a vida extraordinária de uma mulher aparentemente comum, que atravessou a 2ª Guerra Mundial, vivenciou a ditadura no Brasil, esteve no centro de um importante conflito político, no Rio Grande do Norte, viveu um amor estrangeiro e terminou seus dias sozinha, em Natal.” (Sinopse)

Tá esperando o quê? O espetáculo está no SESI, e você não pode perder essa maravilha!

FICHA TÉCNICA

Texto: Henrique Fontes, Iracema Macedo e Pablo Capistrano

Direção: Henrique Fontes

Elenco: Henrique Fontes e Quitéria Kelly

Trilha Sonora: Toni Gregório

Dramaturgia Audiovisual: Pedro Fiuza

Desenho de Luz: Ronaldo Costa

Técnicos Som, Luz e Vídeo: Mateus Cardoso e Robson Medeiros

Fotos divulgação: Ian Rassari

 

JACY

Teatro Firjan SESI Centro

Avenida Graça Aranha, 1, Centro

Temporada até 24/05

Segundas e terças, às 19h

Duração 60 min

Classificação 12 anos

Ingressos R$ 30 e R$ 15 (meia)

Venda pela plataforma Sympla: https://bileto.sympla.com.br/event/72355/d/132175