A precariedade da vida feliz

Era uma vez um espetáculo multimídia que inspirou uma escritora a criar um romance, que levou a autora da peça original a escrever dois roteiros: um para o cinema, outro teatral. Essa é uma história que começou no século passado, mais precisamente em 1987, quando Jocy de Oliveira encenou Realejo dos mundos, uma ópera que trazia a música como elemento essencial à vida. Passadas mais de três décadas, Jocy voltou a se debruçar sobre o tema, transformado em romance por Adriana Lisboa, para criar os roteiros. O resultado gráfico vem no belo volume Realejo de vida e morte, um roteiro de Jocy de Oliveira/Realejo dos Mundos, um romance de Adriana Lisboa (Relicário, R$ 71,80), que traz, além dos textos, fotografias das montagens e partituras.

No romance, Adriana Lisboa quis evocar, poeticamente, a influência da música e da obra de Jocy em sua formação. Já Jocy, ao escrever durante a pandemia o roteiro do longa-metragem, trata das ameaças ao futuro do planeta através dos personagens Muri e Flor, isolados em um lugarejo que vai sendo abandonado pelos moradores, devido ao avanço do mar sobre o território. No entanto, até o prejudicial pode ser modificado. A incerteza que cerca os personagens se apresenta como elemento de resistência e continuidade: mesmo perdendo seu território para o oceano, Flor, grávida, está pronta a abrir-se para um mundo assustador, desde que acompanhada pela música, pois “no princípio era o som. No fim será o som também”.

Sem qualquer pretensão de buscar do leitor algo além de gargalhadas, a transposição da sabedoria do personagem cômico Craque Daniel das telas (pequenas) para as páginas, Você não merece ser feliz (Intrínseca, R$ 39,90), de Pedro Leite e Daniel Furlan, segue a fórmula de tantos manuais de autoajuda, ainda que pregue uma inédita trilha para o insucesso. Craque Daniel é interpretado por Furlan no programa humorístico Falha de Cobertura, que analisa o futebol ao lado de diversas figuras fictícias, entre elas o professor Cerginho, vivido por Caito Mainier.  Seguindo os “toques” espalhados por onze capítulos, o leitor conseguirá, garantem os autores, desenvolver rancor, usar a mentira como vantagem evolutiva da espécie humana e conformar-se com a infelicidade perene que ronda a humanidade. Uma sucessão de piadas sem o menor compromisso com a seriedade que vale a pena desfrutar apenas pelo descompromisso de viver!

Um amor eterno e duradouro, ainda que sem convivência diária é o que une o brasileiro Alexandre e o tcheco Sebastian em O rio entre nós (Quixote, R$ 60), de Thiago Zanon. Mais do que um oceano, o tempo separa os dois apaixonados, que ao longo de décadas poucos dias passam em companhia um do outro, tocando suas rotinas separadamente, embora cada encontro determine uma mudança essencial em suas trajetórias pessoais. Essa novela de estreia do escritor paulista percorre diferentes cenários enquanto o protagonista luta para construir uma trajetória no mínimo satisfatória, já que sua oportunidade de ser feliz está do outro lado do mundo.

A quebra da rotina chega da pior maneira para três mulheres de meia-idade que mantêm uma relação simbiótica desde a adolescência no thriller O melhor da amizade (Faro Editorial, R$ 44,33), de Lucinda Berry. Lindsey, Kendra e Dani compraram casas próximas umas das outras, frequentam o mesmo círculo social e viram os filhos crescer reproduzindo a amizade que une as mães. Até que uma noite, os três rapazes se envolvem num acidente que deixa um morto, outro em coma e o terceiro traumatizado a ponto de não conseguir falar. A investigação policial desvenda segredos que podem explicar o incidente e pôr à prova a lealdade das três amigas.