Uma bandeira de todos

No mês do orgulho LGBTQIA+, no Brasil, percebe-se que, a cada ano, a luta fica mais forte e com maior representatividade. E os artistas nunca ficam de fora, o espetáculo “Monstro” chega também levantando essa bandeira. E não passa desapercebido, sendo praticamente obrigatório aos críticos reverberarem essa mensagem tão visceral quanto necessária.

Com uma filmagem para lá de limpa, impecável, o artista Ricardo Corrêa apresenta-se com persuasão ao encarnar, com potência, um professor de natação e trazer a narrativa de uma história impactante a todos os espectadores.

Mas antes de falar sobre o texto, fica impossível não desenhar o ator e sua retórica. Ele encarna um personagem gay, seus movimentos corporais são perfeitamente equilibrados, muito bem elaborados, que se torna ainda mais prazeroso assistir ao audiovisual.

O olhar do ator entoa debochado ao defender sua intenção de adoção sendo homossexual. É justamente esse o tema dramatúrgico, as tantas dificuldades enfrentadas pelos homossexuais, em todas as esferas. E enquanto narra seu interesse em tornar-se pai, em uma parede pendura fotos de crianças agredidas e assassinadas pelos pais autodenominados “héteros” e pelo Estado.

Cabe no contexto a memória dos meninos Henry Borel e João Pedro, vítimas daqueles que deveriam e teriam a obrigação de defendê-los, ao contrário de matá-los. Tristeza que invade a alma.

As burocracias para a adoção são pertinentes e fiéis ao texto. A dramaturgia faz parte do mundo real, do mundo atual. Nada é descompassado. Tudo é fato, infelizmente!

A voz do ator é latente, convincente e acolhedora. Sequestra cada espectador para dentro do espetáculo e para a realidade dos dias atuais. O preconceito bem desenhado, com uma retórica provocativa, funciona. Tocante e muito comovente. O texto apresenta as narrativas em dualidade. “Fora Bozo!” Em contrapartida, as intenções do amor são lindíssimas, o texto nutrido de todos os bons sentimentos que se carrega, quando se fala dessa espera, dessa vocação, dessa nobre intenção da adoção. Mas fica perceptível, nesse mesmo personagem, um antagonista, que assusta, mas é perfeitamente cabível e coerente ao texto. Atende à proposta da dramaturgia, vale ressaltar que o texto também foi escrito pelo ator Ricardo Corrêa.

Que percepção têm esses profissionais! Iluminação, figurino, filmagem, direção, adequação do elenco, são uma chuva de meteoros, que levam a plateia virtual a suspiros!

Haveria de ser um solo, mas não é, pois o espectador adentra na tela, o defende com a alma, com veemência, devido à dramatização cerzida. O posicionamento político, absolutamente como deveria ser.

A essa altura, o Brasil começa a reconhecer o erro de eleger esse, que o “desgoverna”, não vale se quer escrever o nome do verdadeiro monstro, que habita o Planalto Central. O mesmo, que bem antes de eleito, já vociferava discursos de ódio contra gays, mulheres, negros e tantos outros, que integram esse Brasil multifacetado e miscigenado, mas nada surpreende mais diante das mais de 560 mil mortes.

Normalmente, ao se procurar por um solo, ou ao assistir a um, espera-se exatamente isso do artista. Uma voz potente, um olhar penetrante que fala, uma atuação responsável, que não parece ter medo de errar. O ator vem como um cavalo selvagem carregado de força, sem freios ou arreios, demonstra em cena sua onipotência e perfeição.

Os gays no Brasil de hoje, principalmente com esses governantes, são como uma tábua de tiro ao alvo, comumente atacados por homofóbicos, mas isso não os faz menores, ou menos fortes, muito pelo contrário, a comunidade ganha força, adesão e mais defensores. E isso só vai evoluir, não mais retrocederá, porque é uma luta por humanidade, uma luta de todos.

MONSTRO

On-line e gratuito

Temporada até 11/7

De quinta a domingo, às 21h

Duração 65 minutos

Classificação 16 anos

Gênero Drama 

Ingressos: www.sympla.com.br/teatrosergiocardoso

FICHA TÉCNICA

Dramaturgia e interpretação: Ricardo Corrêa

Direção: Davi Reis

Participação: Rafael Salmona e Davi Reis

Fotos: Alice Jardim

Figurino: Maitê Chasseraux

Iluminação: Fran Barros

Cenário: Cia Artera e Cesar Resende de Santana

Edição: Ricardo Corrêa

Assistente de edição: Zeca Rodrigues

Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê Assessoria – Gisele Machado & Bruno Morais

Produção e Realização: Cia. Artera de Teatro

Instagram: @ciaarteradeteatro