Machismo Maternal

Pleno 2022. Dia das Mães e entre anúncios, presentes, flores e dedicatórias nostálgicas duas mães são tema de manchetes na imprensa brasileira: Ana Luiza e Ive. Gostaria enormemente de não precisar retomar este assunto em minha coluna, mas a necessidade premente em abordá-lo impede que eu me cale. Enquanto busco a grafia certa para o nome das mulheres brutalmente agredidas, vários outros sites irrompem a tela do meu computador. Pesquisas e estatísticas, que tratam da violência doméstica e dos feminicídios. Impossível não se deixar atingir. Meu anseio é descobrir onde estamos errando enquanto sociedade.

É inadmissível que em 2018, 16 milhões de mulheres, acima de 16 anos, tenham sofrido algum tipo de violência, isto equivale a 500 mulheres agredidas por hora. Para além disso, precisamos refletir quanto aos percentuais apresentados na pesquisa do DataFolha, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública: os dois maiores percentuais encontrados são de agressões em casa (42%) e na rua (29%), sugiro que enquanto seres sociais que somos avaliemos nossa participação nisso. A princípio, refiro-me as agressões nas ruas, que tipo de sociedade é esta que faz com que o agressor não tenha sequer medo de fazer uma covardia em público? Será que é a confiança no infame ditado que erroneamente reproduziu-se dizendo ”briga de marido e mulher não se mete a colher”? E quanto aos episódios de agressões em casa?

Majoritariamente os criminosos são maridos, namorados, companheiros, ou ainda os “ex” das vítimas. Que tipo de pensamento permeia a mente desses agressores? O que os faz pensar que são donos, proprietários de uma mulher? Não consigo acreditar que estejamos convivendo em meio a esta barbárie e não nos provoquemos de forma autocrítica sobre qual a contribuição estamos dando para solucionar esse problema.

O machismo estrutural, sem dúvida alguma seria uma resposta. No entanto, existe uma constatação a ser feita: quem pari, quem cria, quem educa os agressores, habitualmente são mulheres, todavia, de um modo geral, o que temos ensinado, (nós homens e mulheres) aos nossos filhos? Temos apoiado discursos como: “quem quiser prenda suas cabras, que meu cabrito está solto”? Temos incentivado nossos filhos homens a serem garanhões, ou a serem leais aos seus sentimentos e a suas parceiras? Temos paparicado nossos meninos, fazendo as tarefas domésticas para eles e não os preparando para aprenderem a tomar conta da roupa deles, da comida deles, da casa deles, de maneira que não se sintam dependentes de mulher alguma na fase adulta? Afinal, deixamos claro aos nossos filhos que não há diferença entre a independência, a vida profissional, familiar e social entre homens e mulheres? São muitas as perguntas a serem feitas. Faça-as. Mesmo que seja para responder mentalmente, em seu íntimo.

Fato é que as duas mulheres que foram agredidas, são parte de uma estatística, que segundo a pesquisa supracitada, em 2018, aponta que em média, por hora, 177 mulheres são espancadas e destas, 76% delas contam que o agressor era conhecido.

O que faz um homem achar que por suspeitar de uma traição, ou pior, por mera insegurança e mente fantasiosa, pode espancar uma mulher por três dias? Não me venham falar sobre diferença de idade, de classe social, nada, nada disso justificaria. E o outro? Como pode se sentir no direito de esperar a mulher chegar de um momento de lazer para espancá-la? Como admitir o argumento de que por ter uma filha de três anos não poderia chegar àquela hora em casa? Nos poupe.

Muitos homens abandonam seus filhos, muitas vezes até dentro de casa mesmo. E quando se separam vão e voltam a qualquer hora, com quem quiserem, sem que a sociedade cobre deles. Emerge a necessidade de iniciarmos essa conscientização se possível no berço. E assim quem sabe, poderemos ter datas especiais como o Dia das Mães e outros 364 dias do ano, com índices de violência contra a mulher mais baixos e uma realidade menos triste e menos covarde como a que temos tido. Só me resta aqui, agradecer as duas corajosas mães que denunciaram, se expuseram, numa atitude de incentivo, para que outras mulheres denunciem e não mais se submetam aos horrores da violência doméstica.