Começa pela cabeça

Já que é pra começar, vamos da capo! Da cabeça, em italiano. Na música escrita, vemos muito este idioma. Possivelmente, porque na época em que houve sua padronização e popularização, a Itália era o centro cultural do mundo, palco de grandes espetáculos, que fomentavam a aquisição de material para se estudar e tocar. Assim, tornou-se a língua padrão, como, hoje, é o inglês.

“Maestro” nada mais é do que mestre e não precisa ser, necessariamente, um regente. Mas, depois, tornou-se o nome do cargo. Quando queremos voltar, dizemos que faremos um “ritornelo”. Este retorno pode ser de um pequeno trecho ou de toda a música, não importa.

O copista, que era o responsável por transcrever a “grade” de partituras do maestro para todos os músicos que iriam tocar, separando as “partes” de cada um, decidia a melhor e mais clara forma de fazer isso, levando em conta o instrumento, a facilidade para leitura, a troca de páginas, virada de folhas, facilidade para se contar os compassos em pausa etc.

A música inicia pela “introduzzione” ou “intro”. A parte intermediária, que separa partes diferentes ou o retorno ao tema, chama-se “intermezzo”. E quando se chega aos preparativos para o encerramento, estamos na cauda ou no “coda”.

Os termos que dizem respeito a andamentos: “Larghissimo, Grave, Largo, Lento, Larghetto, Adagio, Andante, Moderato, Allegro, Vivace, Presto, Prestissimo” e suas variações, já que não se trabalhava com BPM, davam apenas uma ideia do que se buscava, mas não a pulsação exata, sobre a qual se deveria tocar, como se faz hoje com o “click” em estúdio e, até, em apresentações ao vivo.

Aliás, depois que a Inglaterra e os Estados Unidos assumiram o status de referência cultural, os termos foram passando para o inglês. Hoje, se vê muita coisa nesta língua também. É uma salada… Para gravarmos, por exemplo, uma música em francês, pensamos, em português, que temos que começar com “bocca chiusa” e apertar o “record”. Sem esquecer que a própria música é outra linguagem.

Também temos as indicações sobre o tempo, para seguir como um metrônomo: “a tempo”, para dar uma parada: “fermata”, ou se em algum momento, se quer fugir, dando uma roubada: “rubato”. Para se tocar livremente, sem se preocupar com o tempo, se usa o termo latino “ad libtum”. E para retomar o tempo inicial: “tempo primo”. Nas mudanças de andamento, temos o “accelerando” ou “accel” e o “ritardando” ou “rallentando” que também é grifado como ”rall”.

Curioso é que, ao usar as fermatas de ônibus na Itália, a palavra perde um pouco a magia, apesar da satisfação de se compreender o que é. Aqui no Brasil, gostamos de que cada coisa tenha um nome diferente enquanto, lá fora, preferem que o contexto explique aquela mesma palavra que serve para tudo.

Existem as marcas de expressão: “Affettuoso, Con Brio, Cantabile, Vivace, Maetoso, Dolce, Agitato, Animato, Bruscamente, Con amore, Con fuoco, Scherzando” que ainda são acompanhadas dos advérbios de intensidade: “molto”, “assai” e “poco” ou a expressão “ma non troppo”.

Os termos de dinâmica, indicam a intensidade que se deve tocar aquele trecho do mais suave ao mais forte: “pianissisimo, pianissimo, piano, mezzo piano, mezzo forte, forte, fortissimo, fortissisimo” e, para variação, temos o “sforzando”, que é um aumento súbito e os graduais “crescendo” e “diminuendo”.

Quando era mais novo, não compreendia o porquê da expressão: “Fica pianinho aí”. Achava que tinha alguma coisa a ver com o Schroeder, da turma do Snoopy – cala a boca e não dá pitaco, porque você é uma criancinha! – Não relacionava a palavra à suave, plano ou devagar, para mim, era o nome do instrumento.

Mas um dia, fui apresentado a um músico italiano, que pediu para que eu o acompanhasse na compra de um cavaquinho e, depois de pegar algumas dicas, me disse que, primeiro, iria estudar minhas anotações ao “Pianoforte”. Descobria, ali, seu nome completo.

Depois, soube que este nome é dado a um antecessor do piano e pelo mesmo motivo: permitiu fazer todas as variações de dinâmica entre “piano e forte” que seus ancestrais, como o cravo não faziam. Eram Instrumentos sem dinâmica e isso os fazia perder muito da interpretação (cinética, expressão e dinâmica).

Existem duas grandes perguntas, que devem nortear, constantemente, todo estudante de música, profissional ou não: “O que tocar?” e “Como tocar“. Dizem respeito a duas partes inseparáveis da musica, que fazem toda a diferença na execução. Mesmo uma música bem feita precisa de um bom arranjo e boa interpretação. Pois fios soltos, sempre tendem a aparecer.

Como sempre digo, através da música, temos acesso a infinitas conexões, conhecimentos e experiências, basta estar aberto para isso, ter coragem e força de vontade para enxergar e aproveitar o lado bom do que a vida nos oferece. A música é o que me toca. E a você? O que te faz ir além?

Um abraço e até a próxima!

Paz!