Bate-papo com o Diabo 

Querem conversar com o diabo? A recomendação é que topem, porque certamente não irão se arrepender.

Um diabo contemporâneo chega ao teatro Prudential. Não percam tempo, afinal nem sempre se tem a oportunidade de conhecer pessoalmente o icônico, simpático, inteligente e questionador capeta, mais difícil ainda, conseguir uma hora na requisitada agenda dele, para um diálogo sedutor. O Capiroto, é um dos melhores espetáculos presenciais, neste momento de retorno aos palcos italianos. O Prudential foi magnânimo ao utilizar seu espaço externo e permitir aos expectadores deixarem o receio de lado. Mesas devidamente separadas, álcool gel disponível a todos os presentes. Cuidados importantes, nesse momento de tanta insegurança ainda.

E chega o “sete pele”, extremamente elegante, inteligente, conquistador, graças ao ator Leandro Melo, que audaciosamente encarna o diabo com todas as suas artimanhas e trejeitos.

E vem o belzebu, anjo mau, tinhoso, demônio das profundezas, Lúcifer, cão-tinhoso, chifrudo, jurupari, mafarrico, maldito, malígno, malvado, odioso, pai do mal, príncipe das trevas, satã, satanás, serpente do mal, tendeiro, tentador, entre tantos outros codinomes, porque como disse o encarnado, somos muito criativos para isso!

Leandro é exatamente a reencarnação do diabo. Se ele realmente tinha a intensão de se fundir ao cão do inferno, bingo! Conseguiu! A atuação do artista é impecável. Leandro chega com perfeição, é isso — perfeito — não há outro adjetivo. De saltos, com ou sem figurino, ele se identifica de alguma forma ao personagem e mergulha nas profundezas, em Satã.

Mas, ao contrário do que pensam, nada é obscuro, acreditem, o atual presidente é muito pior, o diabo personificado de Leandro, pensa!

Seus movimentos no palco são suntuosos, astutos e, diabolicamente, sedutores. O texto é um mergulho na história do próprio Lúcifer, que nasceu no Cristianismo. E fique claro:  Diabo não é Exu!

O olhar à Lilith é perfeito e muito bem contextualizado, diante das mulheres desta geração. Afinal, a rebeldia desse “demônio-mulher” sempre será cobrada. Um texto bem-humorado, que embarca a plateia rumo ao conhecimento e instiga provocações nada sacras.

Merece reconhecimento, a direção de Rodrigo França. É possível ver um palco completo. Um ator, que não deixa vácuos. Iluminação bem colocada e intercessões bem postas. A dicção do artista é pausada e bem elaborada, fruto de ensaios incessantes, isso é notável. Um trabalho de direção muito bem executado e ainda mais aprofundado, quando o diretor também é o responsável pelo texto. Parece que tudo se encaixa, se entende, se complementa, se enlaça.

Vamos falar de Wanderley Gomes? Wanderley esteve com Cida Moreno, em Luiza Mahin, levando garbo à atriz por meio do figurino, também executado por ele. Aliás, seu trabalho já passou por essa coluna. Só que desta vez, volta também assinando a cenografia. Um trabalho surpreendente, gigante, epopeico, alteroso, admirável, faz jus recolocar os sinônimos de magnífico nessas linhas. Um figurino indiscreto. Aliás, são dois figurinos utilizados pelo Mister capa. E em ambos, Wanderley arrebatou!

Quanta elegância, um primor, um mimo aos olhos.

No cenário, também não cometeu erros. Os vitrais góticos estão lá desenhando o texto. Em alguns momentos os vitrais dialogam com o artista. Ambos contam a história. Sensacional! Sem contar, que jamais se imaginaria o diabo ali, entre os vitrais da igreja. Quanta criatividade! Wanderley é digno de que venham prêmios…

Pedro Carneiro, responsável pela iluminação, também não se distancia dos demais. Mãos de ouro talharam essa obra, com esmero. No canto gregoriano, um diabo abusado e iluminado, que não deve a nenhum Capiroto de grandiosas produções!

Inesquecíveis cenas! Bom espetáculo é aquele que fez valer a pena sair de casa, depois de quase dois anos em isolamento.

Muitos aplausos, a mensagem da besta chega e ninguém discorda. Quer saber qual foi? Corre até o site, reserva seu lugar e um horário na agenda, não se atrase para esse grande encontro. Vá tranquilo, o diabo não é tão mau quanto parece!

O CAPIROTO

Temporada curtíssima

De 13 a 15/8

Sexta e sábado, às 20h Domingo às 19h

Teatro Prudential

Rua do Russel, 804, Centro

Ingressos: variam entre R$ 25 e R$ 80

Adquira seu ingresso: https://bileto.sympla.com.br/event/68243/d/103176

FICHA TÉCNICA

Autor e diretor: Rodrigo França

Elenco: Leandro Melo

Direção de Movimento: Kennedy Lima

Diretor Assistente: Júlio Angelo

Iluminação: Pedro Carneiro

Cenário e Figurino: Wanderley Gomes

Arte Digital: Akueran

Designer: João Eliel

Pesquisa Historiográfica: Rodrigo França e Jonathan Raymundo

Consultoria de Representações Raciais e de Gênero: Deborah Medeiros

Fonoaudióloga: Débora Santos e Luisa Catoira

Visagismo: Vitor Martinez

Costureira: Terezinha Silva

Direção de Produção: Fábio França

Assessoria de Imprensa: Alessandra Costa

Produtores Associados: Fábio França e Rodrigo França

Realização: Diverso Cultura e Desenvolvimento e Orí Produções de Conhecimentos

Foto Divulgação